Materialismo: um sistema que nos corrói de dentro para fora

A propaganda todo dia nos incita a consumir. Seja na televisão, revistas, outdoors, ou nos mais modernos Instagram, Facebook e Pinterest, somos bombardeados fotos intermináveis por de carros, iates, roupas, maquiagem, perfumes, sapatos, mansões, piscinas: algo que, depois de ter visto algumas dúzias, se torna desorientador, até angustiante.

As imagens são, obviamente, destinadas a incitar a desejo e inveja. Mas, às vezes, parecem incitar o desespero. Os homens e mulheres jovens parecem perdidos em suas roupas de grife, diminuídos e desumanizados por suas posses, como se a propriedade tivesse sido revertida. Em vez de serem donos de suas coisas, parece que as coisas é que são donas deles.

Em uma foto a cabeça de uma menina emerge atrás das sacolas de compras Chanel, Dior e Hermes que ela empilhou em sua vasta cama. Mas uma fotografia cujo propósito é ilustrar bastante parece representar um vazio. Ela está sozinha com suas bolsas e sua imagem no espelho, em uma cena que parece saturada de desespero.

Talvez eu esteja projetando meus preconceitos, mas um corpo impressionante de pesquisas psicológicas parece apoiar esses sentimentos. Elas sugerem que o materialismo, uma característica que pode afligir ricos e pobres, e que os pesquisadores definem como “um sistema de valores que se preocupa com as posses e a imagem social que elas projetam”, é tanto socialmente destrutivo quanto autodestrutivo. Ele esmaga a felicidade e a paz de espírito daqueles que sucumbem a ele e está associado a ansiedade, depressão e problemas de relacionamento.

Há muito tempo existe uma correlação entre materialismo, falta de empatia e envolvimento com os outros, e infelicidade. Mas pesquisas realizadas nos últimos anos parecem apontar para uma causalidade. Por exemplo, uma série de estudos publicados na revista Motivation and Emotion mostrou que, à medida que as pessoas se tornam mais materialistas, seu bem-estar (bons relacionamentos, autonomia, senso de propósito, entre outros) diminui. À medida que se tornam menos materialistas, aumenta.

Em um estudo, os pesquisadores testaram um grupo de jovens de 18 anos e os testaram novamente 12 anos depois. Pediram-lhes que classificassem a importância de objetivos diferentes – empregos, dinheiro e status de um lado, e auto aceitação, sentimento de companheirismo e pertencimento do outro. Eles receberam, então, um teste de diagnóstico padrão para identificar problemas de saúde mental. Nas idades de 18 e 30 anos, as pessoas materialistas eram mais suscetíveis a distúrbios. Mas, se nesse período elas se tornaram menos materialistas, elas se tornavam mais felizes.

Em outro estudo, os psicólogos acompanharam os islandeses após o colapso econômico de seu país. Algumas pessoas se tornaram mais focadas no materialismo, na esperança de recuperar o terreno perdido. Outros responderam tornando-se menos interessados em dinheiro e voltando sua atenção para a vida familiar e comunitária. O primeiro grupo relatou níveis mais baixos de bem-estar, enquanto o segundo grupo teve níveis mais altos.

Esses estudos, apesar de sugestivos, demonstram apenas correlação. Mas, os pesquisadores selecionaram um grupo de adolescentes para participar em um programa da igreja criado para afastar as crianças dos gastos e aprender a compartilhar e economizar. A autoestima das crianças materialistas no programa aumentou significativamente, enquanto que a das crianças materialistas no grupo controle caiu. Já aqueles que tinham pouco interesse no materialismo antes do programa não experimentaram nenhuma mudança na autoestima.

Outro artigo, publicado na revista Psychological Science, descobriu que pessoas em experimentos controlados que foram repetidamente expostas a imagens de objetos de luxo, a mensagens que os transformavam em consumidores em vez de cidadãos, e a palavras associadas ao materialismo (como comprar, status, bens e caro), experimentaram aumentos imediatos, mas temporários, nas aspirações materiais, ansiedade e depressão. Elas também se tornaram mais competitivas e mais egoístas, tinham um senso reduzido de responsabilidade social e estavam menos inclinadas a participar em atividades socialmente exigentes. Os pesquisadores apontam que, conforme somos repetidamente bombardeados com tais imagens através de propagandas e constantemente descritos pela mídia como consumidores, esses efeitos temporários podem ser acionados mais ou menos continuamente.

Um terceiro artigo, publicado (paradoxalmente) no Journal of Consumer Research, estudou 2.500 pessoas durante seis anos e encontrou uma relação de mão dupla entre materialismo e solidão: o materialismo promove o isolamento social; o isolamento promove o materialismo. As pessoas que estão isoladas dos outros se ligam às posses o que, por sua vez, diminui ainda mais as relações sociais.

As duas variedades de materialismo que têm esse efeito – usar as posses como um parâmetro de sucesso e buscar a felicidade através das posses – podem ser vistas em quase todas as fotos de propaganda. O materialismo nos força a nos comparar com as posses dos outros de uma maneira tóxica. Não há fim para isso. Se você tem quatro relógios da Rolex enquanto outra pessoa tem cinco, você está um Rolex mais longe do contentamento. A busca material da autoestima reduz a sua autoestima.

Este é o terrível erro que estamos cometendo: permitir-nos acreditar que ter mais dinheiro e mais coisas aumenta nosso bem-estar. Ambição mundana, aspiração material, crescimento perpétuo: uma fórmula para a infelicidade em massa.