O seu perfeccionismo pode ser prejudicial para o seu filho

Os conceitos centrais envolvidos na Teoria da Mente são crenças, desejos e intenções, que são usados para entender por que alguém age de uma determinada maneira ou para prever como alguém irá agir (Kloo et al., 2010). Em geral, a Teoria da Mente envolve a compreensão do conhecimento, das crenças, das emoções e das intenções de outra pessoa e o uso dessa compreensão para navegar em situações sociais. Uma tarefa comumente usada para medir a Teoria da Mente é uma tarefa de crença falsa, como esta a seguir:

Muitas pessoas ficaram horrorizadas com as ideias que Amy Chua apresentou em seu bestseller de 2011, “O Hino de Batalha da Mãe Tigre”, no qual ela relata a “fórmula mágica de Chua”: em que brincar nas casas dos amigos era proibido, a TV era banida e todos tinham que sempre ser número 1 em tudo.

Muitos críticos previram que as filhas dela, Sophia e Lulu, acabariam sendo “robôs mentalmente doentes e sem amigos”, mas, em vez disso, elas acabaram crescendo e se tornando adultas “educadas, modestas e atenciosas”, bem como bem-sucedidas.

Mas as irmãs são a norma ou exceção a esse tipo de parentalidade?

Um novo estudo realizado na cidade-estado asiática de Singapura, notória por sua alta pressão e alto desempenho, ataca essa questão e chega a conclusões preocupantes. A pesquisa, publicada no Journal of Personality, envolveu 263 crianças na escola primária que tinham 7 anos no início do estudo e foram seguidas por cinco anos, de 2010 a 2014.

O trabalho analisa o lado obscuro do perfeccionismo – o perfeccionismo mal adaptativo, no jargão da pesquisa – que se desenvolve nas crianças em idade escolar.

Os cientistas mediram o que chamaram de “intromissão parental” no primeiro ano do estudo, pedindo à criança para resolver alguns quebra-cabeças, enquanto um dos pais – o que estava mais envolvido nos cuidados – estava presente. Eles disseram aos pais que eles deveriam se sentir livres para ajudar a criança sempre que necessário e depois classificaram seus comportamentos. O objetivo era descobrir se os pais interferiam na resolução de problemas da criança e se essa ajuda era mesmo necessária.

No extremo do espectro estavam os pais com o que eles chamaram de comportamento altamente intrusivo. Estas foram as mães e pais que “assumiram o jogo pela criança”, disseram os pesquisadores. Cada uma dessas tentativas foi registrada e codificada e testes semelhantes foram repetidos nas idades entre 8, 9 e 11 anos.

Os pesquisadores então avaliaram aspectos da saúde mental da criança ao falar com a criança e os pais.

E aqui está a parte em que o estudo se torna alarmante. As crianças com pais intrusivos eram mais propensas a criticarem a si mesmas, e essa tendência aumentou com o passar dos anos. E esse nível elevado ou aumentado de autocrítica estava correlacionado com níveis mais altos de depressão e ansiedade.

“Quando os pais se tornam intrusos na vida de seus filhos, isso pode indicar aos filhos que o que eles fazem nunca é bom o suficiente. Como resultado, a criança pode ficar com medo de cometer o menor erro e culpar a si mesma por não ser “perfeita”. Com o tempo, esse comportamento, conhecido como perfeccionismo mal adaptativo, pode ser prejudicial ao bem-estar dela, pois aumenta o risco da criança desenvolver sintomas de depressão, ansiedade e até mesmo suicídio em casos muito graves”, explicou Ryan Hong.

Na amostra de Cingapura, descobriu-se que grande parte das crianças exibiam algum pensamento mal adaptativo sobre si mesmas: 60% foram classificados com níveis altos ou crescentes de “autocrítica” e 78% das crianças com “perfeccionismo socialmente prescrito”. A maioria – 59% – tinha os dois. A autocrítica é uma medida de preocupação com as próprias imperfeições e erros. O perfeccionismo socialmente prescrito refere-se a uma crença de que é necessário atender às expectativas irrealistas.

Estudos anteriores também têm sido críticos à parentalidade excessivamente intrusiva.

Um estudo realizado por Erica Musser, professora assistente de psicologia na Universidade Internacional da Flórida, analisou por que algumas crianças tendem a perder o diagnóstico de transtorno de déficit de atenção/hiperatividade quando mudam da infância para a adolescência enquanto esse diagnóstico persiste em outras. Ela ficou surpresa ao descobrir que autocríticas duras e negativas que apareceram durante as entrevistas com pesquisadores pareciam estar associadas à continuação dos sintomas de TDAH. No entanto, esse estudo não descobriu nenhuma correlação com o envolvimento excessivo dos pais – caracterizado por ser muito emocional em relação a uma criança e fazer coisas como usar referências a “nós” ao falar sobre as atividades ou ações da criança – e a continuação dos sintomas de TDAH.

Em um outro artigo sobre estudantes universitários publicado em 2014 na revista Education and Training, os pesquisadores enfatizaram que há uma distinção importante entre o envolvimento dos pais e o excesso de parentalidade. “Enquanto o envolvimento dos pais pode ser o impulso extra que os alunos precisam para construir sua própria confiança e habilidades, o excesso de parentalidade parece fazer o inverso: a criação de um sentimento de não poder realizar coisas socialmente ou por conta própria”, escreveram os autores.

O estudo mostrou que aqueles estudantes universitários com ‘pais helicóptero’ – termo utilizado como referência para pais que estão sempre “rondando” a vida dos filhos – tiveram dificuldade em acreditar em sua própria capacidade de realizar metas. Eles eram mais dependentes dos outros, tinham estratégias de enfrentamento pobres e não tinham habilidades interpessoais, como responsabilidade e conscientização durante os anos de faculdade.

Hong, professor assistente de psicologia da Universidade Nacional de Cingapura, disse que a intromissão dos pais se manifesta de maneira simples e cotidiana: pais que têm expectativas muito altas sobre o desempenho acadêmico de seus filhos e demonstram isso ao pedir que tirem boas notas ou reagem exageradamente quando uma criança faz algo errado.

Ele sugeriu que mesmo pequenas mudanças em como você fala com seus filhos podem ajudar. Em vez de perguntar se seu filho tirou nota 10 ou um A, você pode perguntar de maneira mais geral como eles foram em um teste. “A primeira pergunta transmite uma mensagem para a criança de que ele ou ela deve obter nota máxima no teste, enquanto a segunda pergunta não transmite tal mensagem”, disse ele.

O conselho de Hong resume-se a: Reduzir a ‘paternidade helicóptero’. Se você sente que deve ser uma Mãe ou Pai Tigre, incentive ao invés de pressionar as crianças. Deixe as crianças errarem!